quinta-feira, 27 de março de 2008

Falta acessibilidade em Ribeirão Preto

Para a estudante de história Mariela Martini atividades como caminhar pelas ruas, andar de ônibus, estudar e trabalhar são verdadeiros desafios. Mariela é portadora de deficiência visual e como tantos outros brasileiros lida no dia-a-dia com a falta de acessibilidade.
De acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica), no Brasil 24,6 milhões de pessoas se declaram portadoras de algum tipo de deficiência, o que corresponde a 14,5% da população.
“Há um despreparo de toda a sociedade em lidar com os deficientes e Ribeirão Preto ainda tem muito a melhorar”, afirma o consultor do ministério das cidades na área de acessibilidade, José Antonio Lanchoti.
Para a presidente do Conselho Municipal de Integração e Promoção das Pessoas com Deficiência, Sandra Rosangela Gonçalves, o maior problema em Ribeirão está no transporte coletivo.
A cidade conta com uma frota de 16 vans especiais pelo sistema Leva e Traz e cinco ônibus adaptados com elevador. Segundo o gerente de transporte coletivo da Transerp, Reinaldo Lapate, todos os anos há o aumento da frota para atender melhor a população e as concessionárias estão dentro da lei.
A lei a que Lapate se refere foi aprovada em 2004 e concedeu o prazo de 10 anos para que todas as frotas de ônibus urbano do país sejam renovadas contemplando a acessibilidade. “A van não pode ser aceita como um meio de transporte acessível, porque ela funciona apenas para casos específicos como educação, trabalho e saúde”, afirma Lanchoti.
Para o pintor e deficiente físico, Gonçalo Mendes Ferreira, a principal dificuldade são as irregularidades nas calçadas, presença de orelhões e lixeiras que tornam, muitas vezes, impossível a locomoção com a cadeira de rodas. O artista autônomo Eduardo Martins de Souza, utiliza muletas e conta que as calçadas pintadas a tinta a óleo se tornam escorregadias.
Lanchoti calculou para sua tese de doutorado o índice de desempenho da caminhabilidade nos espaços públicos de Ribeirão. Nessa leitura ele constatou que os maiores problemas estão nas calçadas dos bairros nobres, em que os proprietários das casas costumam investir na calçada como se fosse uma extensão da casa, assim é comum observarmos grandes rampas para facilitar a entrada na garagem, pavimentação irregular com pedras, grama entre as placas de cimento, vasos enormes, um mobiliário urbano que trás problemas para a circulação de pedestres.
A calçada é do poder público, porém, cada um tem o direito de colocar o tipo de piso que achar melhor, desde que dentro de regras urbanísticas que prevêem o tipo de pavimentação e a o espaço que pode ser utilizado com mobiliário urbano, no entanto, a fiscalização é falha. “São poucos funcionários para muita demanda e a prefeitura tende a investir mais nas ruas do que nas calçadas”, afirma Lanchoti.
Além das dificuldades em ambientes externos, as edificações na maioria das vezes não estão preparadas para receber os deficientes, segundo Lanchoti, iniciar uma obra de maneira acessível acrescenta em torno de 0,02% no custo, no entanto, a reforma de uma construção pode aumentar em até 35% o custo em relação a uma obra não acessivel.

Todos os entrevistados, apesar dos problemas, percebem que mudanças estão acontecendo na cidade mesmo que de forma ainda tímida. Desde 2004 nenhum projeto arquitetônico é aprovado na prefeitura de Ribeirão Preto se não contemplar as questões de acessibilidade. As discussões em torno da temática ocupam a câmara dos vereadores com participação da população e são promovidos cursos na cidade e em todo o país para que engenheiros,arquitetos e agrônomos concebam projetos acessíveis.

Além das barreiras arquitetônicas

O significado de acessibilidade ultrapassa as questões físicas e de transporte, abrangendo segundo a fisioterapeuta, Letícia Holtz Barbosa também a comunicação.
A recém formada em Letras e portadora de deficiência visual Juliana Donega Bernardes, sentiu durante toda sua vida dificuldade em acompanhar as disciplinas das escolas e também na universidade pela falta de materiais disponíveis e de professores preparados para lidar com suas necessidades.
Mariela Martini relatou enfrentar os mesmos problemas. “Na faculdade são muitos textos para ler e é complicado passar todo o material para braile. Eu que consegui para a faculdade um programa especial de computador que me ajuda a acompanhar as aulas”.
Durante os estudos elas buscavam outras alternativas como gravar a fala dos professores e pedir para familiares e amigos lerem os estudos em voz alta.
As duas entrevistadas portadoras de deficiência visual relataram que se candidataram a vagas de emprego anunciadas para portadores de deficiência, porém, ao chegarem na entrevista não foram aceitas porque as empresas não estavam estruturadas para contratá-las.
De acordo com Sandra Gonçalves, faltam conscientização e participação da população nas questões que envolvem o deficiente.
A recém formada em Letras e portadora de deficiência visual Juliana Donega Bernardes, presenciou várias vezes o desrespeito em relação às vagas reservadas aos deficientes em frente a faculdade.
A ADEVIRP ( Associação dos Deficientes Visuais de Ribeirão Preto e região), possui impressora em braile e a disponibiliza para os associados, porém, o processo é lento e o papel para confecção do material é especial.

Um comentário:

Anderson Sanz disse...

Enfim, esta questão começa a se tornar mais abrangente, saindo dos profissionais da área do urbanismo e afins, dos usuários deste sistema ineficiente e das organizações e pessoas que apoiam e se preocupam com esta "causa".
Pena que existe, aqui em Ribeirão Preto, e com certeza, em MUITAS cidades deste vasto país, agentes públicos, engenheiros, arquitetos, empresários e muitos mais, interesses políticos e econômicos que derrubam leis [in]existentes para a acessibilidade.