quarta-feira, 25 de julho de 2007

A grandiosidade das sutis experiências

Na próxima vez que for a uma locadora experimente não ir direto para a seção de lançamentos, olhe aquela prateleira onde os filmes, a maioria em VHS, de tão esquecidos estão até empoeirados. Se delicie passando os olhos pelos que você viu há muito tempo, por aqueles que passam até hoje nas seções de cinema da televisão e prove algo que você nunca assistiu.
Ao chegar em casa vai ser preciso procurar os fios para ligar o vídeo-cassete, verificar se o aparelho ainda funciona e aí sim sentar na poltrona.
O filme escolhido foi “Tempo de Despertar” de 1990, no elenco está Robin Willians no papel de um médico neurologista e Robert De Niro como um doente psiquiátrico.
A história relatada é verídica, baseada no livro homônimo do neurologista britânico Oliver Sacks. Sacks escreveu vários livros relatando suas experiências com pacientes, muitos deles reconhecidos como obras de potencial literário como “ Um antropólogo em Marte”.
“Tempo de Despertar” conta uma história vivida em 1969 em Nova York, em que pacientes com letargia encefálica, que viviam há anos dependendo dos outros para as tarefas mais simples, foram tratados com uma droga experimental e voltaram à vida.
Quando os pacientes retornam à expressão de suas vontades e sentimentos eles querem recuperar todo o tempo que estiveram como em um estado de “sono”, assim cada pequeno prazer é valorizado.Eles passam a perceber a vida como uma criança que aflita deseja descobrir tudo o que a rodeia.
O tempo passa a ser visto de forma relativa, a maioria dos pacientes ficaram mais de 20 anos em estado letárgico, ao olharem no espelho percebem que seu corpo envelheceu, porém, sua alma precisa explorar as sensações do mundo.
Apesar de os pacientes quererem descobrir o universo além do hospital, eles estão em tratamento e não podem sair daquele pequeno espaço, o que traz revolta para alguns, especialmente para o personagem de De Niro - Leonard, que não consegue compreender porque tem que permanecer ali.
A droga que os faz sair do estado de apatia trouxe efeitos colaterais inesperados e a doença parece querer vencer.
A forma como a história é contada não relata apenas um caso médico, mas nos faz pensar em como lidamos com a nossa própria vida, na valorização das pequenas sensações.
Assim com o decorrer do filme nos envolvemos com cada personagem, os sorrisos e as lágrimas expressam-se como se estivéssemos juntos deles.
Assistir a um filme em que a história é verídica remete a sensações diferentes da ficção, este em especial nos leva a refletir a nossa vulnerabilidade diante da vida.

O novo cinema brasileiro



Nos acostumamos tanto a ver filmes, que parece que cada vez se torna mais difícil sermos surpreendidos.O filme “O cheiro do ralo” conseguiu a façanha de ser surpreendente do inicio ao fim, todos os movimentos são inesperados, os personagens vão do cômico ao trágico em um piscar de olhos e as sensações que despertam em quem assistem passam pelas gostosas risadas à angustia.
A direção é de Heitor Dahlia, que dirigiu seu primeiro longa “Nina” em 2004, um diretor que podemos dizer que faz parte do cenário underground do cinema brasileiro.O filme é uma adaptação do livro homônimo de Lourenço Mutarelli
O livro é a primeira experiência em romance do cartunista Mutarelli, que tem por característica em suas histórias em quadrinhos embutir em seus heróis particularidades da sociedade contemporânea.
O personagem principal desta história, de nome também Lourenço é vivido por Selton Mello, que foi responsável também pela co produção do filme.
Lourenço é dono de uma estranha loja de objetos usados, por onde passa todo tipo de gente, querendo vender as mais bizarras peças que são selecionadas de forma ininteligível por ele. O humor se constrói pela forma como seus clientes são tratados, relações momentâneas em que o personagem abusa do sarcasmo.
A maioria dos atores nunca havia interpretado, o que traz um ar de teatro para o filme, as interpretações são exageradas, o que ao contrário do que poderia se prever faz com que a história aproxime-se do cotidiano.
A trama tem como protagonista o cheiro que vem do ralo do banheirinho da loja. Lourenço no inicio parece se incomodar e se desculpa o tempo todo pelo cheiro desconfortável, porém, com o andamento do filme o tal cheiro passa a ser uma obsessão e a ter importância filosófica para explicar as suas ações.
O roteiro remete à loucura cotidiana, às confusões de pensamento e de desejo que cercam todo ser humano. Assim, o riso do cinismo do personagem passa a ser uma risada de si mesmo.
Quem assiste ao filme pode ter todo tipo de reação com o personagem, raiva, ódio, dó, carinho, ou todos esses sentimentos juntos, é como se ele tivesse alma, uma personalidade própria que pode cativar ou desagradar.
O filme agradou aos críticos no Festival de Sundance, no Festival do Rio e na Mostra Internacional de São Paulo, onde foi eleito como melhor filme.
Selton respondeu de forma concisa a pergunta sobre o que era o filme em entrevista à Terra Magazine : “é um filme impossível de explicar, só assistindo”.