domingo, 28 de agosto de 2011

Uma outra comunicação é possível?

A comunicação como a entendemos hoje, relacionada aos meios de comunicação, nasce com os ideais da Idade Moderna, que se diferencia da Idade Média essencialmente pela concepção de sujeito autônomo, impulsionada pelos ideais iluministas. Portanto, a comunicação estava vinculada ao ideal revolucionário de ampliação da esfera pública, compreendendo esfera pública como a dimensão da vida social em que as pessoas podem manifestar suas ideias livremente.

Emerge então na sociedade moderna a demanda pela informação, pela ampliação do debate público. Partindo desses pressupostos, podemos considerar que a história do jornalismo acompanha a história da sociedade moderna. Ciro Marcondes Filho (2000) chama a primeira fase do jornalismo de jornalismo de Ilustração, trata-se de publicações que defendiam causas políticas específicas. A segunda fase pode ser chamada de jornalismo mercantil, que passa a vender informação e a tentar diferenciar informação de opinião.

Com a venda de informações o jornalismo caminhou para a criação e ampliação de empresas de comunicação e o fortalecimento dessas empresas juntamente com o desenvolvimento de tecnologias da informação, remete ao que poderíamos chamar hoje de jornalismo tecnológico, que busca ser multilinguagem e é marcado pelo monopólio das empresas transnacionais.

Analisar esse percurso passa inevitavelmente pelas tentativas de compreensão da sociedade moderna como um todo. Octavio Ianni (2000) coloca que, na modernidade conceitos clássicos como cidadania, ideologia e sociedade são compreendidos como consumo, mercadoria e mercado e são estes últimos os crivos do que é disseminado pelos grandes meios de comunicação.

Quando falamos em jornalismo tecnológico, estamos tratando de uma nova esfera representativa que está se construindo com o avanço surpreendente das novas tecnologias. Esta nova perspectiva afeta todas as relações e cria novas formas de compreensão da realidade e das representações. Muniz Sodré (2002) desenvolveu o conceito de bios midiático em que, revisitando as instâncias da vida colocadas por Aristóteles, afirma que há um novo espaço de existência contemporâneo, que possui valores técnicos, sociais e burocráticos próprios e que tem como uma de suas características a supervalorização da imagem, fortalecendo os simulacros e criando uma outra esfera pública com ideais diferentes daqueles colocados por Habermas (1984), que intensifica a falsa sensação de democratização do poder e da informação.

De maneira paralela e concomitante, nascem formas de comunicação independentes aos poderes instituídos, é o que John Downing (2002) chama de mídia radical alternativa, que tem como seus argumentos centrais a pluralidade das culturas populares e o diálogo constante entre as culturas de oposição, culturas de massa e culturas populares.

Na busca de um conceito de cultura popular, Downing (2002) problematiza alguns teóricos como Theodor Adorno e Max Horkeimer, autores da Escola de Frankfurt. Adorno, ao rever o conceito de cultura de massa produzida dentro da lógica industrial, desenvolve o conceito de indústria cultural. Downing coloca que a indústria cultural impede a criatividade e limita a construção simbólica para além das classes dominantes.

Ao observamos a abordagem sócio histórica de cultura popular colocada pelos teóricos dos Estudos Culturais (Escola de Birmingham), constata-se que, na busca por trabalhar os conceitos de maneira dialética, que em Stuart Hall (2003) estão inseridos em uma perspectiva diaspórica (compreende as hibridizações inevitáveis entre as culturas, especialmente diante dos processos de deslocamentos marcados pelas migrações e imigrações), há uma superação de conceitos enrijecidos de cultura popular, que a vinculam a uma tradição folclorista, não engajada e limitada dentro de um espaço de tempo e território.

Para Downing (2002), toda forma de mídia influencia de alguma maneira o movimento das sociedades, portanto, o estudo contextualizado da comunicação não pode ignorar as manifestações que não estão vinculadas à grande mídia. Ainda de acordo com o autor, as manifestações artísticas como danças, anedotas, teatro, gravuras, filmes, tatuagens, murais e grafite podem ser compreendidas como mídia radical tanto quanto o uso de meios mais tradicionais de comunicação como os jornais, emissoras de rádio e televisão e a internet.

O cenário da comunicação brasileira se demonstra cada vez mais perverso, marcado por monopólios, pelo não respeito aos artigos da Constituição, por guerras claras de poder e pelo uso indevido das informações, em um processo que mais confunde do que esclarece a população.

A concepção de uma mídia para além dos grandes grupos transnacionais de comunicação, independentemente de ser chamada alternativa, radical, subalterna, contra-hegemônica ou popular, se caracteriza essencialmente pela crítica e pela manifestação da diversidade e é necessária para a construção de uma sociedade que saiba lidar melhor com a pluralidade de culturas.


Bibliografia:

MARCONDES FILHO, Ciro. A Saga dos Cães Perdidos.São Paulo: Hacker editores, 2002

HABERMAS,Jurgen. Mudança Estrutural da Esfera Pública. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984

IANNI, Octavio. Enigmas da Modernidade Mundo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000

SODRÉ, Muniz. Antropológica do Espelho. Petrópolis: Vozes, 2002

DOWNING, John. Mídia Radical. São Paulo : editora SENAC, 2002

ADORNO, T e HORKHEIMER. M. Indústria Cultural – o esclarecimento como mistificação das massas. In: Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Zahar, 1996.

HALL, Stuart. Da Diáspora: Identidades e Mediações Culturais. Belo Horizonte: UFMG, 2003.

sábado, 30 de abril de 2011

Tatyana, de Deborah Colker


No palco uma grande armação de madeira móvel parecida com uma árvore, corpos se movimentam sincronizados com uma música forte e rápida, escalam a árvore, desafiam os sentidos do público e os olhos que não parecem capazes de acompanhar tantos movimentos.
Assim começa o primeiro ato do espetáculo de dança contemporânea Tatyana, assinado pela Cia Deborah Colker. A carioca Colker é conhecida como a diretora do movimento, e não há dúvidas sobre sua capacidade de surpreender.
O segundo ato da apresentação conta com efeitos de iluminação sobre grandes telas que dão a impressão de haver dois ou três planos no mesmo palco. Diferentemente do primeiro ato, rápido e colorido, o público adentra um universo mais exato que lembra filmes antigos, preto e branco, movimentos lentos e sincronizados.
O espetáculo é baseado na obra do russo Aleksandr Pushkin, nomeada “Evguêni Oniéguin”, no entanto, não é preciso conhecer o texto para se emocionar com a beleza da coreografia que conta uma história com duelos, morte, paixão, encontros e desencontros. Os personagens parecem buscar algo em seu próprio corpo ou no corpo dos outros, danças solitárias se completam com as coreografias coletivas em um movimento de solidão e companheirismo.
Tudo é simples e majestoso ao mesmo tempo, o cenário parece desafiar os dançarinos e o figurino é rico em pequenos elementos como as sapatilhas que parcialmente cobrem os pés descalços. A iluminação também parece brincar com as cores e possibilidades, o palco nunca está totalmente aparente, há sempre algum movimento a ser descoberto pela luz e os enigmas com as sombras. O apagar e acender das luzes no segundo ato enriquecem a teatralidade do espetáculo.
Provocante em todos os momentos, a apresentação permite um êxtase sensorial e a sensação de que poderia ver a mesma coreografia inúmeras vezes.

segunda-feira, 14 de março de 2011

madrugada

depois de um sonho ruim
um vislumbre
de que a vida,essa que corre lá fora
e dentro de mim
está querendo carinho