quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Tradição que sobrevive


Músicas sobre a chegada de Jesus, vestes coloridas, sorrisos nos rostos e uma fé que impressiona. Em novembro começam as peregrinações das Companhias de Folia de Reis de todo o Brasil para o grande dia: 6 de janeiro, quando é comemorado o dia de Santos Reis. A tradição que vem da roça chega a 2008 com algumas mudanças, mas com o mesmo clima de fé e esperança.
A jornada dos reis Magos do Oriente é a essência da celebração da Folia de Reis que reúne fiéis conduzidos pela crença e devoção religiosa de diversos países da Europa e América, contribuindo para o desenvolvimento de tradições populares.
O principal símbolo de cada companhia de Reis é a bandeira que é um canal de comunicação, por ser sempre o primeiro elemento da Folia e é levada pelo bandeireiro ou alferes, que a carrega como cumprimento a alguma promessa. A bandeira traz uma imagem bíblica da Sagrada Família: Menino Jesus, São José e Virgem Maria na manjedoura, os Três Reis Magos e animais. Os fiéis prendem a esta imagem fotos, figuras de Santos, fitas e pedidos que representam preces, promessas e agradecimentos.
Logo atrás da bandeira vêm os guardiões, que são os palhaços, o capitão, mestre ou embaixador que muitas vezes é a pessoa responsável pela companhia e é quem puxa os versos; o contra-mestre que é quem faz a segunda voz e os demais elementos que cantam e tocam instrumentos como violas, violões, sanfonas, cavaquinhos, pandeiros, caixas e castanholas. Os músicos são nomeados de acordo com a sua posição de voz.
As nomenclaturas, símbolos e a maneira de cantar dependem de cada região do país. A formação da Folia de Reis é composta de elementos da cultura ibérica, que trazem em sua bagagem traços da cultura árabe, e no Brasil sofreram incorporações também da cultura negra e indígena, o que originou uma tradição rica em sincretismos religiosos.
Tal força da religiosidade, neste caso especialmente do catolicismo, também se explica pela colonização brasileira em que os conquistadores utilizaram a religião como maneira de integração entre as diversas etnias.
Todos vestem uniformes coloridos e os instrumentos musicais são ornados com faixas coloridas. Apesar de toda cor os palhaços são os elementos que chamam mais atenção com suas máscaras, apitos e seu dançar contínuo. Eles representam os protetores do menino Jesus e também protegem a bandeira da Companhia, para isso carregam um bastão, além de levarem uma pequena bolsa para colocarem as “esmolas”. Estes personagens mostram a mistura de ritos cristãos e pagãos em uma cerimônia da Igreja Católica.
A vestimenta é uma maneira de cada envolvido no evento se tornar representante de um ato maior, em que é protagonista. Estes elementos que compõem a vestimenta destacam a criatividade da população que, apesar das dificuldades materiais, utilizam suas formas de arte para celebrar seus rituais, o que revela o quanto estas manifestações preenchem internamente os que delas participam, afirma Victor Júnior Ferreira, que participa da Folia de Reis em Ribeirão Preto há 12 anos. “É uma tradição realmente movida pela fé”.
Os versos, na maioria, são passados oralmente de pai para filho ou improvisados e quando as companhias visitam as casas, as rimas são construídas de acordo com a promessa ou devoção daquela família.
Com o passar dos anos, a Folia de Reis sofreu diversas transformações, a maioria delas ligadas à mudança de costumes com a urbanização. Na área rural a Folia de Reis começava na noite de natal e os cristãos cantavam todos os dias e noites em peregrinação, por todas as casas das vilas e fazendas, sem retornarem para seus lares, até seis de Janeiro, atualmente as companhias cantam e visitam casas de fiéis, quando convidados, durante 13 finais de semana (a tradição conta que a viagem dos reis magos durou treze dias), devido aos trabalhadores não poderem faltar do serviço durante a semana, para participarem da peregrinação.
A partir destas manifestações é possível compreender como o passado e o presente de uma determinada sociedade se articulam. Antes da ampliação dos meios de comunicação as festas eram um dos principais meios da população se afirmar como coletividade. Hoje, vivemos uma época de individualidade e as festas reafirmam as identidades.
Por este resgate através de elementos artísticos e culturais diversos como textos, músicas, danças, imagens, oralidades, crenças, costumes e tantos outros a festa se constitui também como um atrativo turístico e revela para as novas gerações uma manifestação de cultura e de fé.

Nenhum comentário: