sexta-feira, 13 de abril de 2007

Jornalismo de Guerra

Em 31 de agosto de 1946, foi publicada pela revista The New Yorker uma das mais marcantes reportagens da história mundial.
O jornalista era John Hersey, o tema a bomba de Hiroshima. Foram 300 mil exemplares dedicados exclusivamente ao assunto, esgotados em pouquíssimo tempo. Existem relatos de que foram vendidas cópias da revista por 20 dólares, sendo que o preço de banca era 15 centavos e que Albert Einstein chegou a pedir mil exemplares, mas não foi atendido.
Hersey acompanhou a vida de 6 pessoas sobreviventes à bomba, e através das experiências dessas pessoas diante da catástrofe, relatou de forma jornalística como a cidade de Hiroshima passou pelo choque, em que morreram 100 mil pessoas, deixando inúmeros feridos.
Poucas reportagens conseguiram transpor o limite do tempo e continuarem a ser lidas e discutidas anos depois da publicação. A notícia superou de tal forma a fronteira temporal que 40 anos depois foi publicado o livro Hiroshima, em que Hersey relata a sua volta a cidade japonesa para reencontrar os personagens de sua reportagem e, entender as seqüelas da bomba na vida dessas pessoas tantos anos depois.
John Hersey é considerado o pai do jornalismo literário, uma forma alternativa de se fazer jornalismo, em que a notícia é tratada de forma abrangente, buscando o viés contrário ao da grande mídia, desvinculada das práticas recorrentes no jornalismo diário em que a maior preocupação é com a velocidade de divulgação das informações.
O jornalista teve a preocupação de tratar a realidade de forma sóbria, tomando uma postura de distância das 6 vidas retratadas, porém o livro comove e envolve o leitor ao longo de suas 172 páginas.
A reportagem é um marco na história por mostrar uma das mais importantes funções do jornalismo que é questionar os fatos e buscar uma leitura crítica. Depois da publicação várias outras coberturas questionadoras foram publicadas.
Um exemplo recente é do jornalista Seymor Hersh, também da The New Yorker, que em 2003 publicou as imagens de soldados americanos humilhando prisioneiros de guerra muçulmanos, e provou que tais fotos não eram retratos de fatos isolados, como alegou o governo estadunidense, mas sim estratégia de guerra.
Comecei a ler Hiroshima pensando em compreender melhor o jornalismo literário, e acabei emocionada com a luta daquelas pessoas, de como apesar de terem sido alvo direto da crueldade da guerra e terem sofrido todo tipo de seqüelas, do físico ao psicológico, elas resistiram e reconstruíram suas vidas e sua cidade.
O fato de que outros países pouco se mobilizaram com o sofrimento dos japoneses, e de que continuaram realizando testes nucleares mesmo após as explosões em Hiroshima e Nagasaki , nos faz refletir sobre quantas vidas já foram e ainda são perdidas somente para se provar poder.
Mais impressionante ainda é saber que guerras ainda estão acontecendo e, que os EUA através da sua força militar e da violência direta, continuam mantendo sua hegemonia econômica de mais de 60 anos.
Nos acostumamos a abrir o jornal e depararmo-nos com as reportagens de guerra, fotos de pessoas ensangüentadas não nos tocam mais. Talvez se a reportagem de Hersey tivesse sido escrita agora, já não comoveria a sociedade civil como sensibilizou nos anos 40. A nossa postura frente a guerra não só internacional, mas principalmente em relação a guerra cotidiana, é colocada em xeque ao terminarmos a leitura de “Hiroshima”.

2 comentários:

Segunda Pele disse...

Passe para deixar um beijo!
E com certeza esse comodismo e naturalismo permanente em que demonstramos diante do bárbaro, deveria definitivamente mudar. Mas a mudança parte de nós mesmos, e vc deu uma ótima dica!

Beijos Lelê, manda beijos pra tia Sandra! Espero que esteja tudo bem por aí!

Anônimo disse...

Infelizmente a divulgação constante de tragédias e leitores para elas - a psicologia até têm explicação para o fenômeno- torna banal assistir essas situações sem comover-se ou rfletir sobre elas. Mas isso começou lá nas arenas em que se soltavam leões famintos para comerem cristãos, portanto.....